sábado, 18 de julho de 2009

Outros Sonhos



Sonhei que o fogo gelou
Sonhei que a neve fervia
Sonhei que ela corava
Quando me via
Sonhei que ao meio-dia
Havia intenso luar
E o povo se embevecia
Se empetecava João
Se impiriquitava Maria
Doentes do coração
Dançavam na enfermaria
E a beleza não fenecia

Belo e sereno era o som
Que lá no morro se ouvia
Eu sei que o sonho era bom
Porque ela sorria
Até quando chovia
Guris inertes no chão
Falavam de astronomia
E me jurava o diabo
Que Deus existia
De mão em mão o ladrão
Relógios distribuía
E a polícia já não batia
De noite raiava o sol
Que todo mundo aplaudia
Maconha só se comprava
Na tabacaria
Drogas na drogaria
Um passarinho espanhol
Cantava esta melodia
E com sotaque esta letra
De sua autoria
Sonhei que o fogo gelou
Sonhei que a neve fervia
E por sonhar o impossível, ai
Sonhei que tu me querias.

Soñé que el fuego heló
Soñé que la nieve ardia
Y por soñar lo impossible, ay, ay
Soñe que tu me querias.

Chico Buarque

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Sorri =)



E ao notar que tu sorris, todo mundo irá supor que és feliz!

C. Chaplin & Tuner G. Parsons
Versão: João de Barro (Braguinha)
Gravação: Djavan "Sorri."

terça-feira, 28 de abril de 2009

As Escolhas de uma Vida

Algumas pessoas constantemente mudam de vida com tanta facilidade e desapego, chego até a me surpreender. Para outras, no entanto, mudar é um trabalho tão árduo, torna-se sinônimo de insegurança, medo, infindáveis questionamentos por não saber se é capaz de 'segurar a barra' de todas as consequências e surpresas que acompanham a mudança. Será que isso é característico de pessoas frágeis? Eu acho que não! Decidir mudar, não é fácil, e é por isso que o mundo está repleto de pessoas infelizes e frustradas no campo emocional, profissional, familiar e tantos outros, exatamente porque optaram por não mudar, mesmo quando era preciso, não tentar parecia mais seguro.
Uma amiga, queridíssima, me enviou este texto escrito pela escritora Martha Medeiros, cujo o tema fala de nossas escolhas e decisões de uma forma simplificada e inteligente. Gostaria de compartilhar com vocês.

A certa altura do filme Crimes e Pecados, o personagem interpretado por Woody Allen diz: "Nós somos a soma das nossas decisões". Essa frase acomodou-se na minha massa cinzenta e de lá nunca mais saiu. Compartilho do ceticismo de Allen: a gente é o que a gente escolhe ser, o destino pouco tem a ver com isso. Desde pequenos aprendemos que, ao fazer uma opção, estamos descartando outra, e de opção em opção vamos tecendo essa teia que se convencionou chamar "minha vida". Não é tarefa fácil. No momento em que se escolhe ser médico, se está abrindo mão de ser piloto de avião. Ao optar pela vida de atriz, será quase impossível conciliar com a arquitetura. Se é a psicologia que se almeja, pouco tempo sobrará para fazer o curso de odontologia. Não se pode ter tudo. No amor, a mesma coisa: namora-se um, outro, e mais outro, num excitante vaivém de romances. Até que chega um momento em que é preciso decidir entre passar o resto da vida sem compromisso formal com alguém, apenas vivenciando amores e deixando-os ir embora quando se findam, ou casar, e através do casamento fundar uma microempresa, com direito a casa própria, orçamento doméstico e responsabilidades. As duas opções têm seus prós e contras: viver sem laços e viver com laços. Escolha. Morar em Londres ou numa chácara? Ter filhos ou não? Posar nua ou ralar atrás de um balcão? Correr de kart ou entrar para um convento? Fumar e beber até cair ou virar vegetariano e budista? Todas as alternativas são válidas, mas há um preço a pagar por elas. Quem dera pudéssemos ser uma pessoa diferente a cada 6 meses, ser casados de segunda a sexta e solteiros nos finais de semana, ter filhos quando se está bem-disposto e não tê-los quando se está cansado, viver de poesia e dormir em hotel 5 estrelas. No way*. Por isso é tão importante o auto-conhecimento. Por isso é necessário ler muito, ouvir os outros, estagiar em várias tribos, prestar atenção ao que acontece em volta e não cultivar preconceitos. Nossas escolhas não podem ser apenas intuitivas, elas têm que refletir o que a gente é. Lógico que se deve reavaliar decisões e trocar de caminho: ninguém é o mesmo para sempre. Mas que essas mudanças de rota venham para acrescentar, e não para anular a vivência do caminho anteriormente percorrido. A estrada é longa e o tempo é curto. Quanto menos a gente errar, melhor.

Martha Medeiros

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Não se acostume...


Não se acostume com o que não o faz feliz,
Revolte-se quando julgar necessário.
Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas.
Se achar que precisa voltar, volte!
Se perceber que precisa seguir, siga!
Se estiver tudo errado, comece novamente.
Se estiver tudo certo, continue...

Se sentir saudades, mate-a.
Se perder um amor, não se perca!
Se o achar, segure-o!

Fernando Pessoa

sexta-feira, 13 de março de 2009

Que importa?...


Eu era a desdenhosa, a indiferente.
Nunca sentira em mim o coração
Bater em violências de paixão,
Como bate no peito à outra gente.
Agora, olhas-me tu altivamente,
Sem sombra de desejo ou de emoção,
Enquanto as asas louras da ilusão
Abrem dentro de mim ao sol nascente.
Minh’alma, a pedra, transformou-se em fonte;
Como nascida em carinhoso monte,
Toda ela é riso, e é frescura e graça!
Nela refresca a boca um só instante…
Que importa?… Se o cansado viandante
Bebe em todas as fontes… quando passa?…

Florbela Espanca - A mensageira das violetas

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Receita de Ano Novo



Para você ganhar belíssimo Ano Novo
Cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)



Para você ganhar um ano
Não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
Mas novo nas sementinhas do vir-a-ver,
Novo até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)



Novo, espontâneo, que de tão perfeito se nota,
Mas com ele se come, se passeia, se ama, se compreende, se trabalha,
Você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
Não precisa expedir nem receber mensagens
(planta ou recebe mensagens? passa telegramas?).



Não precisa fazer lista de boas intenções para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido pelas besteiras consumadas,
Nem parvamente acreditar que por decreto da esperança
A partir de janeiro as coisas mudem e seja tudo claridade,
Recompensa, justiça entre os homens e as nações,
Liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
Direitos respeitados, começando pelo direito augusto de viver.



Para ganhar um ano-novo que mereça este nome,
Você, meu caro,
Tem de merecê-lo, tem de fazê-lo de novo,
Eu sei que não é fácil, mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre.



Carlos Drummond de Andrade